quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Baseado em fatos reais

Era uma vez um anúncio de varejo. Ele vivia em uma cidade com outros anúncios institucionais e premiados. Todos se gabavam de seus layouts ousados, seus títulos engraçados ou de seus slogans memoráveis. Mas ele, tadinho, era só um anúncio de varejo cheio de “gerentes pirados” e “preços imbatíveis”. Os outros anúncios viviam caçoando dele: “Pra quê tanto texto legal? Afinal, o que é que ele tem de legal?” E todos riam debochando de seus splashes e cores berrantes.

Na escola, o anúncio de varejo era o último a ser escolhido no time de futebol, o único que ainda levava lancheira pro intervalo e sempre sobrava nos trabalhos em grupo. Todos os anúncios andavam juntos, em campanhas: os all types com títulos maravilhosos, os anúncios com tratamentos de imagem incríveis, os que faziam rir e os que faziam chorar. Todos tinham uma sacada genial e eram ótimos em português, artes e educação física. Todos, menos o anúncio de varejo.

Ele tinha tudo para ser problemático, virar um depressivo, alcoólatra ou psicopata, mas não. O anúncio de varejo seguiu a sua vida berrando para alguém vir correndo aproveitar a queima de estoque: “É só até este fim de semana!!!”, gritava ele há umas três semanas. Porque era isso o que ele era, um anúncio de VA-RE-JO. Escandaloso, repetitivo e com a marca quase no tamanho do produto. O anúncio de varejo nunca ganhou um prêmio, nunca conheceu Cannes e nem teve ninguém brigando para assumir sua paternidade.
Com o tempo, ele aceitou que seu lugar era nos classificados do jornal e não na contra capa da revista, e foi só aí que ele entendeu por que foi criado. O anúncio de varejo cresceu, foi pra faculdade, se formou e nunca deixou de ser o que era. E sabem de uma coisa? Ele é sempre chamado para todos os encontros da turma do colégio, mesmo que seja apenas para pagar a conta.


Priscila Midori - redatora carioca
texto original aqui

Nenhum comentário:

Postar um comentário